quarta-feira, 7 de março de 2012

GENRO: UMA PALAVRA QUE ME GELA A ESPINHA.- MARCUS FLAVIO DA SILVA(FOTO)



31 - Genro: uma palavra que me gela a espinha


Você, que tem uma filha de quinze ou dezesseis anos, se pudesse escolher para ela um namorado, como ele seria?
Se fosse para mim essa pergunta, sem pensar muito, eu responderia: “Ele não seria. Essa pessoa não existe no mundo”. Mas com um pouquinho de bom senso, eu chego à conclusão de que não tem jeito. Ela vai namorar. Mas com quem? Sempre quando eu penso nisso, sou tomado por um preconceito arrebatador. Tento vencê-lo, mas é como se eu nadasse contra uma corrente poderosa demais. E assim eu me vejo analisando possíveis pretendentes, julgando-os pelas aparências [coisa horrível] e tirando dessas análises superficiais as conclusões mais absurdas e irracionais.
Ontem mesmo eu cruzei com um rapaz na rua: cabeludo, cheio de tatuagens pelo corpo, com um piercing enorme atravessando o lábio inferior, barbudo [a barba crescia no pescoço e emendava com os pêlos do peito, que pulavam pra fora da camisa rasgada: era de embrulhar o estômago]. O cara passava uma imagem de desleixo e sujeira: era como se o fracasso tivesse criado pernas, braços e cabeça e saído por aí [preconceito típico do mundo capitalista]. E me imaginei no futuro, abrindo a porta da sala, a minha filha entrando com esse mesmo sujeito e dizendo “Pai, esse aqui é o Jack Boy, meu namorado”. O que eu faço numa situação dessas? Cumprimento o ser? Como? Pego na mão dele? Digo “Entra”?
Entrar? Eu vou deixar que ele entre na minha casa, na minha vida e, o pior: na vida da minha filhinha? Imediatamente um filme começa a passar na minha cabeça: minha mulher grávida, eu sentindo os chutinhos dela dentro da barriga, o dia do nascimento [a emoção que eu senti ao pegá-la no colo pela primeira vez], o primeiro banho, as primeiras brincadeiras, o primeiro aninho, o primeiro livrinho [e as historinhas que eu contava para ela], os beijinhos, os bilhetinhos, o carinho, o amor que só quem tem um filho pode saber como é... E eu vou entregar esse meu tesouro para o JACK BOY? Vou entregar a minha VIDA para um cara que no dia de conhecer os sogros nem se deu ao trabalho de lavar os pés encardidos e passar um bicarbonato com limão debaixo dos braços para tirar o cheiro azedo da fermentação suvacal? Vou entregar o que eu tenho de mais precioso para um sujeito que tem hálito de gambá e fica o tempo todo balançando a cabeça e falando “Sóóó, legal...”?
Puro preconceito. Claro. Ou será que é impossível um rapaz desses fazer a minha filha feliz? Talvez ele a faça mais feliz do que um filhinho de papai todo certinho, de terninho bem cortado, estudante de Direito ou de Medicina na UFMG. [E parece que quase todos os pais gostariam que as suas filhas namorassem um estudante da UFMG, de preferência do curso de Medicina, que dá mais status: e os futuros médicos adoram se exibir por aí, com as camisas do curso e adesivos “Medicina UFMG” colados nos seus carros, geralmente ganhados de presente de seus papais e mamães – imitando aqueles pavões machos que abrem seus belos leques de penas, plumas e cores para atrair as fêmeas mais interessantes].
E não precisamos procurar muito para encontrar famílias constituídas da forma “como deve ser” [casamento na Igreja, casa própria, marido bem de vida, encontros de casais, etc.] onde a mulher apenas finge ser feliz: finge viver. Assim como não é difícil encontrar casais alternativos, onde o marido (meio doidão) é poeta, compositor, escritor e, por isso, pobre (lógico), mas onde, mesmo assim, há harmonia, liberdade, alegria e felicidade verdadeiras.
Existem casais respeitáveis, riquíssimos, cuja união se deu da forma mais tradicional e“correta”, mas que não vivem em paz, estão sempre preocupados com o dinheiro, com a imagem de respeitabilidade e prosperidade que devem transmitir à sociedade, etc. E ao mesmo tempo existem casais que não ligam para nada disso e que, embora passem uma imagem de desleixo e sujeira, vivem muito bem, amam muito e curtem a vida, com liberdade e respeito.
Será que eu estou equivocado? Ou exagerando?
É claro que existem muitos casais “respeitáveis” que vivem bem, e muitos casais “desleixados” que não vivem bem. Isso é muito relativo. Mas acho que dei o meu recado.
O que você pensa disso?
QUEM É MARCUS FLÁVIO DA SILVA



Nascido em Pará de Minas- MG em 1975. Possui graduação em História pela Universidade Federal de Minas Gerais (1997) e doutorado pela Universidade federal de Minas Gerais (2002) com estágio (Doutorado- sanduíche/CAPES) na Universidade de Lisboa- Portugal (2002). Atualmente é Vice- diretor da Faculdade de Pará de Minas- FAPAM-(MG) onde já exerceu os cargos de Coordenador do Curso de História, coordenador do NUPE- Núcleo de Pesquisa, e foi professor nos cursos de História e Administração. Atualmente leciona nos cursos de Direito e Pedagogia. É autor do livro SUBSISTENCIA E PODER: a política do abastecimento alimentar nas Minas Setecentistas (Editora UFMG -2008) e de artigos publicados em periódicos e livros de História. Um de seus trabalhos foi publicado no livro HISTÓRIA DE MINAS GERAIS- As Minas Setecentistas (Editora Autentica 2007) obra vencedora do PREMIO JABUTI
2008 na categoria Ciências Humanas. Atualmente exerce também a função de Pesquisador Institucional da Faculdade de Pará de Minas junto ao Ministério da Educação, sendo responsável pelo acompanhamento dos processos e renovação de reconhecimento dos cursos de graduação da IES. Em 2009 foi eleito para a Academia de Letras de Pará de Minas.
www.nwm.com.br/fms

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